O deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP) apresentou à Câmara, o PLP (Projeto de Lei Complementar) PLP 199/24, que autoriza os estados e o Distrito Federal a legislar sobre questões específicas de Direito do Trabalho.
A proposta do deputado príncipe, como ele é chamado na Câmara, regulamenta o parágrafo único, do artigo 22, da Constituição Federal, que diz que lei complementar poderá autorizar os estados a legislar sobre questões específicas das matérias relacionadas neste artigo. Assim, em se tratando de direito do trabalho, os estados e o DF poderiam legislar sobre as seguintes questões:
1) contrato de trabalho temporário, sazonal ou intermitente;
2) contrato de aprendizagem;
3) normas sobre estágio de estudantes;
4) políticas de inserção de jovens e idosos no mercado de trabalho;
5) regime de teletrabalho ou trabalho remoto;
6) mediação e arbitragem trabalhista; e
7) normas sobre o trabalho relacionado ao turismo colaborativo.
Na justificativa do projeto, o deputado alega que, especificamente no “âmbito do Direito Trabalhista”, a “centralização” na União “muitas vezes resulta em uma legislação distante da realidade cotidiana de trabalhadores e empregadores em diferentes estados”.
Ele alega ainda preocupação com as dimensões continentais e pluralidade econômica, social e cultural”. “Ajustes locais são não apenas desejáveis, mas indispensáveis para uma legislação efetiva, representativa e respeitada”, afirma o parlamentar no documento.
Competências privativa, comum e concorrente
A competência privativa, prevista no artigo 22 da Constituição, é designada especificamente para a União. No entanto, LC (lei complementar) poderá autorizar os estados a legislar sobre questões específicas relacionadas às referidas competências.
Precedente dessa delegação é a LC 103, de 14 de julho de 2000, que autorizou os estados e o DF a instituir, mediante lei de iniciativa do Poder Executivo, o piso salarial de que trata o inciso V, do artigo 7º, da Constituição, para os empregados que não tenham piso salarial definido em lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho.
Todavia, cabe ressaltar que há também a competência exclusiva, que não é passível de delegação.
A competência comum, também, chamada de competência administrativa, refere-se ao âmbito administrativo. Prevista no artigo 23 da CF, é atribuída a todos os entes federativos, sem exceção: à União, estados, DF e municípios. Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre os entes federativos, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.
Competência concorrente
A competência concorrente é prevista no artigo 24 da CF. Nos seus termos, compete à União, aos estados e ao DF legislar, concorrentemente, sobre diversos temas, destacando-se direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico; orçamento; custas dos serviços forenses; produção e consumo; proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico; educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação; Previdência Social, proteção e defesa da saúde; proteção e integração social das pessoas portadoras de deficiência; proteção à infância e à juventude; e organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis.
Cada ente tem competência plena para dispor sobre estes temas naquilo que diga respeito ao seu território, cabendo à União o poder de estabelecer normas gerais. Nesse caso, os entes podem exercer a competência suplementar. Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os estados exercerão a competência legislativa plena, para atender às peculiaridades. Sobrevindo lei federal sobre normas gerais, suspende-se a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.
Preocupação e atenção
Além do precedente da LC 103/00, que afastou, na prática, a unicidade do salário mínimo prevista no artigo 7º, IV da CF, ao permitir aos estados e DF fixarem pisos salariais próprios, este projeto faz lembrar o chamado “negociado sobre o legislado”, o centro nervoso da Reforma Trabalhista — Lei 13.467/17 — aprovada pelo Congresso Nacional.
É que a negociação sobre a lei sempre existiu na CLT, embora implicitamente.
Antes da RT, os acordos e convenções sempre eram para superar a legislação trabalhista. Ao explicitar, em lei, que os acordos e convenções poderiam se superpor à legislação, os direitos e conquistas foram implodidos. Inclusive, com o enfraquecimento da organização sindical.
O MPT (Ministério Público do Trabalho), em nota técnica, chamou atenção para o fato de o legislador, na lei aprovada, desejar explicitar o que estava implícito, na verdade, não era para acrescentar direitos ou fortalecer a negociação trabalhista, mas sim retirar direitos, enfraquecer a negociação e vulnerar a organização sindical. O resto da história todos conhecem.
O projeto de lei em comento pode ter efeito ainda pior, pois esvaziaria a própria CLT e abriria espaço para que os temas previstos na proposta sejam tratados de forma diferenciada em cada estado, e em bases piores do que as previstas na legislação federal.
Além da fragmentação do Sistema Jurídico e da insegurança jurídica que a partir daí decorre, seria fortemente ampliada a tendência ao retrocesso social, sob o pretexto (falso) de redução de encargos e ampliação da oferta de empregos.
Tramitação
Embora a proposição ainda não tenha sido distribuída às comissões temáticas pertinentes, o texto deverá ser examinado, inicialmente, pela Comissão de Trabalho. E, finalmente, pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).
FONTE: DIAP