Professora e pesquisadora diz que o projeto aprovado aprofundará desigualdades sociais
Quando, em 2013, na Câmara dos Deputados, uma comissão propôs um primeiro projeto de lei (PL 6840/2013) de Reforma do Ensino Médio, eu e alguns colegas escrevemos um Manifesto. Chamamos de “O Ensino Médio em migalhas”. Quando, em 2017, com o golpe da medida provisória e aprovação da lei 13.415/17, em 16 de fevereiro, escrevi um texto que chamei de “O Ensino Médio Líquido”, dada a fluidez e indefinições propositais da lei aprovada e que levaram a propostas curriculares gelatinosas e inconsistentes no que diz respeito a assegurar formação de qualidade para os/as jovens brasileiros/as e enfrentamento das desigualdades educacionais.
Em 2023, quando após alguma pressão o MEC enviou à Câmara dos Deputados um novo projeto de lei (PL 5.230/24) que visava reformar a reforma do que passou a ser chamado de Novo Ensino Médio, mas que teve a relatoria designada ao deputado que, quando ministro, havia sido o responsável pela publicação da medida provisória, e que, numa primeira ação grotesca tentou retomar as propostas da famigerada medida provisória, eu publiquei um texto nas minhas redes sociais. Denominei de “O Ensino Médio pisoteado”.
E nesta semana, no dia 10 de julho de 2024, mais de 10 anos após o início desta história, escrevo novamente. E agora batizo de “O Ensino Médio em Ruínas”. Ruínas pelo procedimento golpista do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), no dia da votação, que impediu o debate qualificado e permitiu a aprovação em bloco de todas as rejeições propostas pelo grotesco relator ao texto produzido no Senado Federal que, ainda que não revogasse a lei 13.415/17, continha avanços substantivos. Avanços na direção do enfrentamento das desigualdades educacionais que recaem sobre a juventude brasileira, 85% dela estudando em redes estaduais públicas de ensino médio, e a quem caberá juntar os cacos do que lhes será oferecido.
Tudo isso sob aplausos do líder do governo Lula na Câmara dos Deputados. E sob aplausos do ministro da educação, Camilo Santana (PT). Em que pese o ganho com a ampliação da carga horária mínima para a formação científica básica de nossos jovens, de 1.800 para 2.400 horas, esse ganho não se destina ao conjunto de estudantes. Quem fizer o itinerário da formação técnica e profissional, terá uma redução para 2.100 horas da formação geral básica.
E muitos dos problemas do Novo Ensino Médio em fase de implementação ainda vão permanecer, pois constam do projeto de lei aprovado: Ensino a distância, notório saber para a docência, oferta privada do ensino médio público, cursos de curta duração que não habilitam profissionalmente.
O relatório de Mendonça Filho, votado e aprovado sem discussão e às pressas na Câmara dos Deputados, traz ainda uma novidade (péssima): os processos seletivos para ingresso no ensino superior irão avaliar, não somente os conteúdos da base nacional comum, mas, também, a parte (diversificada) dos itinerários formativos. Como isso será feito? Até o momento, ninguém tem resposta para isso, que ocasionará mais uma desvantagem para jovens de escolas públicas estaduais, onde estão 85% das matrículas.
O projeto aprovado tem fortes indícios de acentuar ainda mais as desigualdades educacionais que já caracterizam a educação brasileira. Mas ao contrário do que pensam os que comemoram, a história não se encerra aqui. A luta continua!!
* Profª Drª Monica Ribeiro da Silva, é professora titular na Universidade Federal do Paraná, pesquisadora do CNPq – PQ1C, coordenadora do Grupo de Pesquisa Observatório do Ensino Médio, Rede Nacional EMPesquisa – Pesquisas sobre Ensino Médio
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Fonte: BdF Paraná
Edição: Ana Carolina Caldas
FONTE: BRASIL DE FATO