Economistas apontam as inconsistências do BC na definição da Selic e na alta do dólar

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Ao manter a Selic e o dólar altos, mercado nega a dinâmica interna que conta com redução do desemprego e inflação controlada

Na coluna econômica da última quinta-feira (4), o jornalista Luís Nassif apontou que passou despercebido do mercado e da mídia a atuação do Banco Central no mercado de câmbio desde o início do ano, com intervenções de US$ 800 milhões por dia. 

A atuação do presidente do BC, Roberto Campos Neto, tem sido criticada pelo Planalto nos últimos meses, em especial desde a manutenção da Taxa Selic há duas semanas em 10,50% ao ano, interrompendo um ciclo de cortes devido à alta do dólar e ao aumento das incertezas econômicas.

Para comentar esta que foi a principal temática da área econômica da semana, Nassif recebeu no programa Nova Economia o economista, professor titular de pós-graduação da PUC-SP e consultor de diversas agências da ONU, Ladislau Dowbor, e o doutor em desenvolvimento econômico pelo Instituto de Economia da Unicamp, Euzébio Jorge Silveira de Sousa.

“Existe um esforço para transmitir um caráter de tecnicidade às ações do BC que, no meu juízo, não existe. Parece que está se buscando uma análise técnica ultra sofisticada de algum modelo econométrico que explicam as ações do BC no último período e vai se buscando um conjunto de dados que não corroboram com um cenário econômico contemporâneo, levando em consideração a redução da taxa de desemprego no Brasil, inflação bastante controlada”, observa Sousa.

O doutor em desenvolvimento econômico ressalta que o mercado financeiro usa como justificativa o processo de instabilidade muito grande no cenário internacional, que afeta a economia dos países, inclusive a brasileira.

“Como se não bastasse, o epicentro do capitalismo global vive uma instabilidade bruta, seja porque estão envolvidos em conflitos internacionais insolúveis e que eles não conseguem dar respostas concretas, seja porque na própria eleição existe um caráter de instabilidade profundo, que é evidente que o último debate que o [presidente norte-americano e candidato à reeleição Joe] Biden participou gera mais um processo de tensão política e econômica dos Estados Unidos, e que gera instabilidade em todos os países”, continua Sousa. 

Sem perspectiva

No âmbito internacional, o cenário econômico não deve melhorar no curto prazo, uma vez que os EUA enfrentam o que Euzébio Sousa chama de dilema complexo diante do questionamento da hegemonia econômica norte-americana como sua peça central o potencial de eles emitirem a moeda de transação internacional. 

“Eles têm um poder que nenhum outro país possui. Para que eles garantam essa hegemonia econômica,  precisam garantir que todas as economias do mundo de alguma forma mantenham reservas na moeda desse país e utilizem essa moeda para utilizar o comércio”, emenda o convidado. 

Mas a política bélica que garante os interesses econômicos e a tensão com a China, que desponta com destaque na economia mundial, agravam a dinâmica interna dos EUA.  

Dólar 

A cotação do dólar atingiu, na última semana, um dos maiores valores nos últimos dois anos e meio: R$ 5,65. Mas a alta, como explica Ladislau Dowbor, não precisava atingir tal patamar, tendo em vista as reservas financeiras superiores a US$ 300 bilhões, herança das gestões Lula 1 e Lula 2. 

“Isso nos torna simplesmente protegidos, porque se o dólar explode, você pode simplesmente, com as reservas que temos, colocar dólares à venda no mercado, além do cara que comprou mais caro especulando que vai subir, ele está começando a perder dinheiro, vai começar a vender e a coisa abranda. Qualquer presidente do BC com o mínimo de bom senso faria isso. Agora o bom sendo do nosso presidente do BC não é estabilidade da economia”, adverte Dowbor.

O economista e consultor explica ainda que, quanto mais alta a cotação do dólar, os exportadores recebem mais em reais pelas vendas, o que seria “um presentinho para os amigos” do presidente do BC.

Taxa de juros

Ao manter a taxa Selic alta, Campos Neto contribui para dois fenômenos no país: o aumento do desemprego e da desigualdade. 

“Juros altos gera desemprego, que gera redução de salários, que gera menor entusiasmo dos empresários de investirem e produzirem e também gera um incentivo maior para que a riqueza do país seja alocada exclusivamente em ativos financeiros”, analisa Euzébio Sousa. 

Assim, o doutor em desenvolvimento econômico ressalta que a alternativa para quebrar o atual cenário imposto pelo BC é criar um projeto de desenvolvimento nacional associada a “taxas de juros civilizadas e esteja associado a uma capacidade de estado poder realizar investimentos em setores estratégicos”, ao contrário da máxima de déficit zero que o mercado financeiro tanto prega.

Fonte: Jornal GGN